Doutor em Comunicação (PPCOM-UFPE), doutor em Letras/Linguística (PPGL-UFPE) e atualmente pós-doutorando em Direitos Humanos na Universidade Federal de Pernambuco (PPGDH-UFPE). Pesquisador membro do NUCEPI - Núcleo de Estudos em Compreensão e Produção (Inter) Linguísticas (CNPq/PPGL-PPGDH/UFPE) e do PHiNC - Publicidade Híbrida e Narrativas de Consumo (CNPq/PPGCOM/UFPE).
Advogada Licenciada. Assessora de Magistrado. Mestranda em Direitos Humanos - PPGDH/UFPE. Pós-graduanda em Direito Constitucional Aplicado e em Direito do Consumidor. Bacharela em Direito pela Faculdade de Ciências da Administração de Garanhuns.
No dia 1º de março de 2020, a matéria jornalística "Mulheres trans presas enfrentam preconceito, abandono e violência" foi exibida no programa televisivo Fantástico, da Rede Globo. Apresentada pelo médico oncologista Drauzio Varella, a reportagem tinha como enfoque retratar o cotidiano de detentas transexuais nas prisões brasileiras. Após o depoimento comovente de uma das entrevistadas chamada Suzy de Oliveira Santos, Varella a abraça, consolando-a. Interpretado a princípio como expressão de acolhimento e humanidade, o gesto do profissional foi logo em seguida agressivamente criticado pela opinião pública após ter sido divulgada a ficha criminal da custodiada, que envolvia estupro e assassinato de um garoto de 9 anos de idade. Diante da controvérsia gerada, este artigo propõe investigar e problematizar discursos, argumentos, opiniões, visões de mundo, etc. que começaram a circular socialmente, sobretudo nas redes sociais digitais, desde que a matéria do Fantástico foi ao ar e que buscaram deslegitimar e desumanizar o corpo e a vivência de uma mulher transexual encarcerada, que havia recebido atenção e tratamento empático pela mídia. Para a presente discussão, são trazidos os aportes teóricos e conceituais dos estudos queer, entre eles, Sedgwick (1990), Butler (2003; 2018), Louro (2004), Preciado (2011), Miskolci (2016) e Bento (2016). Os resultados apontam para a premente necessidade de se pautar questões como o papel da mídia e das redes sociais digitais na construção e disseminação de narrativas, representações e juízos de valor compatíveis com a dignidade humana, particularmente no que tange ao corpo e à vivência de pessoas trans.
Citas
ADVOGADA de Suzy sofre ataques e aciona OAB. Jornal GNN, 12 mar. 2020. Disponível em: https://bit.ly/3iIM2lt. Acesso em: 7 out. 2021.
AGAMBEN, Giorgio. Homo sacer: o poder soberano e a vida nua. 2. ed. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2002.
BAGAGLI, Beatriz Pagliarini. Direitos transgêneros e despatologização: qual é a relação? In: BEJARANO, Bruna; MOCELLIN, Viviane (Orgs.). Estudos de gênero: mudanças e permanências nas relações de poder. Curitiba: Artemis, 2020. p. 83-94.
BENEVIDES, Bruna G.; NOGUEIRA, Sayonara Naider Bonfim. Dossiê dos assassinatos e da violência contra travestis e transexuais brasileiras em 2020. São Paulo: Expressão Popular, ANTRA, IBTE, 2021.
BENTO, Berenice. Transfeminicídio: violência de gênero e o gênero da violência. In: COLLING, Leandro. Dissidências sexuais e de gênero. Salvador: EDUFBA, 2016. p. 43-67.
BIROLI, Flávia; MACHADO, Maria das Dores Campos; VAGGIONE, Juan Marco. Gênero, neoconservadorismo e democracia: disputas e retrocessos na América Latina. São Paulo: Boitempo, 2020.
BUTLER, Judith. Corpos em aliança e política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.
BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
CAMILO, Elaine. Mulheres trans presas enfrentam preconceito, abandono e violência. Rio de Janeiro: Rede Globo, 2020. Programa de TV Fantástico [exibido em: 1 mar. 2020]. Disponível em: https://bit.ly/3uVs8bR. Acesso em: 7 out. 2021.
DAHU, Najeen. O que é o quê?. Além da Cadeira, 8 abr. 2021. Disponível em: https://bit.ly/30eos9T. Acesso em: 7 out. 2021.
DETENTA trans Suzy já recebeu 234 cartas após reportagem do Fantástico, diz secretaria de SP. G1, 7 mar. 2020. Disponível em: https://glo.bo/3FtSnux. Acesso em: 7 out. 2021.
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. 13. ed. São Paulo: Graal, 1999.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 27. ed. Petrópolis: Vozes, 1987.
GAMSON, Joshua. As sexualidades, a teoria queer e a pesquisa qualitativa. In: DENZIN, N.K.; LINCOLN, Y.S. (Orgs.). O planejamento da pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed/Bookman, 2006. p. 345-362.
JESUS, Jaqueline Gomes de. Transfeminismo: teorias e práticas. Rio de Janeiro: Metanoia, 2014.
LEITE JUNIOR, Jorge. Transitar para onde?: monstruosidade, (des)patologização, (in)segurança social e identidades transgêneras. Estudos Feministas, Florianópolis, v. 20, n. 2, p. 559-568, maio/ago. 2012.
LOURO, Guacira Lopes. O corpo estranho: ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
MISKOLCI, Richard. Teoria queer: um aprendizado pelas diferenças. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2016.
MISKOLCI, Richard; CAMPANA, Maximiliano. “Ideologia de gênero”: notas para a genealogia de um pânico moral contemporâneo. Sociedade e Estado, Brasília, v. 32, n. 3, p. 725-747, set./dez. 2017.
MOMBAÇA, Jota. Para desaprender o queer dos trópicos: desmontando a caravela queer. SSEX BBOX, 28 ago. 2016. Disponível em: https://bit.ly/3akVoiL. Acesso em: 7 out. 2021.
MOTTA, Luiz Gonzaga. A análise pragmática da narrativa jornalística. CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 28., 2005, Rio de Janeiro. Anais [...]. Rio de Janeiro: Intercom, 2005. p. 1-15. Disponível em: <https://bit.ly/35gAcb6>. Acesso em: 7 out. 2021.
PELÚCIO, Larissa. Subalterno quem, cara pálida?: apontamentos às margens sobre pós-colonialismos, feminismos e estudos queer. Contemporânea, Salvador, v. 2, n. 2, p. 395-418, jul./dez. 2012.
PEREIRA, Pedro Paulo Gomes. Queer decolonial: quando as teorias viajam. Contemporânea, Salvador, v. 5, n. 2, p. 411-437, jul./dez. 2015.
PRECIADO, Paul B. Multidões queer: notas para uma política dos “anormais”. Estudos Feministas, Florianópolis, v. 19, n. 1, p. 11-20, jan./abr. 2011.
RUBIN, Gayle. Políticas do sexo. São Paulo: Ubu, 2017.
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Processo nº 1016800-76.2020.8.26.0005. Procedimento Comum Cível. Ação de Indenização por Danos Morais. Requerente: não identificado. Requerido: Globo Participações e Comunicações S/A e Antônio Drauzio Varella. Juíza de Direito: Regina de Oliveira Marques. Conjur, 21 jun. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3Fx44AD. Acesso em: 7 out. 2021.
SEDGWICK, Eve Kosofsky. Epistemology of the closet. Berkeley: University of California Press, 1990.
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 3.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.
VARELLA, Drauzio. Nota sobre reportagem do Fantástico. UOL, 8 mar. 2020a. Disponível em: https://bit.ly/3Dk1rAr. Acesso em: 7 out. 2021.
VARELLA, Drauzio. Sobre a minha participação na matéria do Fantástico. YouTube, 10 mar. 2020b. Disponível em: https://bit.ly/3AnxkpG. Acesso em: 7 out. 2021.